Peço desculpas. O título original deste texto seria “Como ser chique”. Mas chique virou uma palavra brega. As pessoas ricas e sofisticadas gostam de dizer que são simples. Tenho uma amiga dona de um conversível de luxo. Sempre diz:
– Só tenho esse carro porque gosto de sentir o vento na cara, o contato com a natureza.
Mentira. Para sentir o ventinho, bastava arrumar um leque de papel. O conversível é seu segundo carro. O primeiro, obviamente, é blindado. Quem usa a palavra chique hoje em dia é gente de classe média. Existe um truque para parecer sofisticado: fazer expressão de tédio, sempre. Na primeira classe ou até na executiva de um avião. O rico, que pode ter sido obrigado a ir na executiva por falta de primeira, só aceita água. Oferecem todos os vinhos maravilhosos, ele faz ar de exaustão e fica na água com a saladinha – porque rico não come, faz regime o tempo todo. Classe média é aquele que se atira em todos os vinhos, aperitivos, itens do menu. O rico coloca a máscara preta nos olhos, toma um calmante e dorme até o pouso. Recentemente fui a um restaurante francês, o Ambroisie, um dos melhores de Paris. Comi ovo pochè com caviar, me deliciei, espalhei gema no rosto, lambi o prato. E ainda pus uma foto no Instagram. Uma pobreza, reconheço. Alguém sofisticado olharia o prato com desprezo e mandaria trocar, usando algum pretexto, como não gostar de gema mole.
Mandar trocar é outro item de sofisticação. Você já viu alguém degustar o vinho e devolver no restaurante? Ninguém tem coragem, se servirem vinagre, nós, pobres tímidos de classe média, brindamos e fingimos que está bom. Não conheço vinho, mas, como fico sem jeito de confessar essa falha, digo que está bom. Todo mundo é um pouco assim. Menos o rico, que realmente conhece a uva e a safra. Devolve a garrafa e faz o restaurante arcar com o preju. Para fazer o gênero simples, como manda o cânone da riqueza, um milionário conhecido meu diz que adora comida caseira:
– Para mim, feijão com arroz e pastel é a melhor comida do mundo!
E ainda pensa que a gente acredita! Outra amiga milionária apareceu numa festa com um par de brincos enormes. Agitando os dedos com diamantes, contou que havia comprado na 25 de Março, onde passara o dia – para quem não é de São Paulo, a 25 é uma rua de comércio bem popular. Imaginei a rica cercada de seguranças no meio dos camelôs. Devem ter pensado que era alguma nova candidata à Presidência fazendo comício.
A arte da frescura é cheia de armadilhas. Os realmente sofisticados têm um universo particular. Dia desses vi uma bolsa de quase R$ 200 mil. Juro, 200 mil. É de uma grife famosa, toda em couro de crocodilo. Uma mulher exagerada pode até comprar em parcelas e desistir da entrada para a casa própria. E alucinar as amigas numa festa, exibindo o tesouro. A rica compra, enche como se fosse um sacolão. Atira em cima da mesa, como se estivesse farta da bolsa, da vida e da humanidade em geral. Gente sofisticada cria cavalos, faz festas de casamento onde é proibido fotografar, com bolos tipo esculturas, defende a ecologia e adora um casaco de pele. Há milhares de itens na vida de alguém sofisticado que você nunca conhecerá, caso não faça parte desse mundo.
Fica a dica: para parecer fino, elegante, sofisticado, vá lá, chique, só existe uma norma: a cara de tédio. Ou nojo. Está comendo e errou o talher? Bote a cara de nojo e fique cavoucando o prato como quem odeia a comida. Se o garçom perguntar se há algum problema com o prato, diga:
– Está tudo bem. É que estou sem apetite.
E faça mais cara de nojo ainda.
Há coisas que nunca se podem fazer. Roubar sabonetinho e xampu de hotel. É uma pobreza total. Pior ainda se embrulhar os sabonetinhos e der de presente. Pior do pior, é roubar sabonete de motel. Confesso, acho uma gracinha aqueles sabonetes pequenininhos. Mas onde botar? No banheiro para visitas, para ficarem sabendo que você foi em motel baranga – pelo sabonetinho se conhece o motel! Xi, foi ao que anuncia promoção de pernoite com café da manhã? Se tiver um relacionamento, vai engolir o sabonetinho quando o descobrir esquecido no porta-luvas do carro?
Mas, se você não quer ser brega, basta aparentar tédio. Ou fazer cara de nojo, como já expliquei.
Ah, sim, também não converse. Limite-se a “sim” ou “não”. Gente chique nunca está a fim de conversar. O silêncio é sofisticadíssimo.
Walcyr Carrasco


